Opinião
Às margens do Ipiranga
Por Sergio Cruz Lima
É no Ipiranga. É à beira da estrada velha, junto ao ribeirão, rente de uma casinhola barreada. Paisagem tipicamente paulistana: descolorida e morta. Pelas lombas do morro, estirões de pastos ensapezados. Eitos de guaxuma. Vastos chãos de barba-de-bode constelados de cupins. Ali, sob o sol cru, sesteia um bando de guapos cavaleiros. Que linda moçada! Desenham, no feio da paisagem, uma nota galharda, muito viva. Vivíssima! Vestem fardamentos que berram, portam espadins e boldriés, trazem vistosos capacetes dourados, dos quais o dragão despenca a sua bela cauda de tufos carmesim. Que é aquele rancho luzido? Toda a gente o sabe: é a famosa Guarda de Honra, que segue, de vila em vila, sua alteza, o príncipe dom Pedro. Naquele instante, a Guarda descansa da penosa jornada.
De súbito, nos torrões da estrada, reboa áspero pateado de cavalos. Ao longe, sob véus de poeira, apontam dois cavaleiros desabalados. De rédeas soltas, vêm a toda brida. Voam! Na colina, em frente à Guarda de Honra, os homens estancam. Os ginetes espumam brancos de suor. São dois correios da corte, logo reconhecidos por Manuel Marcondes de Oliveira e Mello, futuro barão de Pindamonhangaba. "Vossa mercê, senhor Paulo Bregaro? E também vossa mercê, senhor Antônio Cordeiro? Que é isso? O que é que os traz por aqui com tanta fúria?" E fala Paulo Bregaro, sem apear:
"Vimos da corte, senhor Maneco Marcondes! De Portugal trazemos despachos urgentes das cortes portuguesas e uma carta de dom João VI. Do Rio de Janeiro portamos duas cartas: uma de José Bonifácio e outra de dona Leopoldina. Nela, escrevia a princesa: "Pedro, o fruto está maduro, colhe-o, antes que algum aventureiro o faça". E Bregaro indaga: "Em que lugar está sua alteza?" A resposta não se faz esperar: "Ficou atrás, no caminho, ali pela altura dos Moinhos. Mais um quarto de chão, senhor, e vossa mercê topa logo com sua alteza". Os correios não mais esperam. Espoream os cavalos e partem a galope. Logo somem numa revoada de poeira.
Às dezesseis horas da tarde primaveril de 7 de setembro de 1822, às margens do riacho Ipiranga, após a leitura dos documentos recebidos que mesclam de cólera a face rubra do príncipe português, um fato novo há de mudar para sempre a história do Brasil: a Independência!
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